Em Romanos 7.14, o apóstolo Paulo discorrendo
sobre a Lei diz:
“Porque sabemos que a lei é espiritual...”. Em concordância
com este texto bíblico o Catecismo Maior de Westminster afirma que a lei é espiritual significando que a lei não diz respeito “apenas à nossa conduta ou
atos exteriores, mas à nossa vida espiritual, aos nossos pensamentos e estados
mentais, às nossas emoções, desejos e também às decisões da nossa vontade.”[1]
Este princípio de que a lei é espiritual visa
estabelecer que “... na lei a vida do homem é amoldada não só à honestidade
exterior, mas também à retidão interior e espiritual”.[2] A Lei não é apenas formal e exterior, mas também
espiritual e interior. Ao dizer que a Lei é espiritual, o apóstolo Paulo coloca
a Lei acima da categoria humana, ou seja, a vida do homem deve ser regida pela
Lei, mas não somente para uma prática de vida “externa”, mas também para uma
justiça interna e espiritual.
Não podemos separar a Lei do seu legislador.
As leis humanas não são e nem podem ser espirituais, por que seus legisladores
são carnais. A natureza carnal da lei humana decorre de seu legislador carnal e
humano. O mesmo acontece com a Lei de Deus, é espiritual, e decorre sua
natureza espiritual de seu legislador que é Deus e que é espírito (Jo 4.24).
Este também é o ensino de Cristo sobre a Lei.
No seu famoso Sermão da Montanha, Jesus profere uma série de interpretações
sobre a Lei. Os fariseus tinham semeado entre o povo opiniões erradas em
relação à Lei. Para eles a abrangência da Lei referia-se ao homem exterior
proibindo “somente” os atos externos e que, embora o erro repousasse no coração
do homem e no coração tencionasse cometer atos de maldade, mas, não sendo eles
cometidos exteriormente, então, não haveria pecado,[3] e nem condenação ante o juízo divino.
Jesus rebateu este ensino trazendo à tona o
caráter espiritual da lei. “Ouvistes que foi dito: Não adulterarás. Eu, porém,
vos digo: qualquer que olhar para uma mulher com intenção impura, no coração,
já adulterou contra ela” Mateus 5.27-28. Kevan aqui explica que “Cristo não se
opõe à Lei de Moisés, mas apenas busca interpretá-la acertadamente e remover
dela as coisas que a têm corrompido e obscurecido.”[4] Cristo não remove e nem mesmo adiciona novas obrigações
na lei, ele mesmo diz: “Não penseis que vim revogar a lei ou os profetas, não
vim para revogar, vim para cumprir” Mateus 5.17, e, quanto a adicionar novas
obrigações à Lei, a própria perfeição da lei da qual já vimos (veja post anterior) demonstra
que isso seria impossível.
Sendo assim, se um governo humano estabelece
uma lei que proíba, por exemplo, o assassinato, o roubo e o adultério, aqueles
que somente desejarem matar, roubar ou adulterar, não serão punidos por este
governo humano, pois, não chegaram a colocar sua vontade em prática. Isso
acontece porque o legislador mortal não se estende além daquilo que é exterior.
Mas, sendo Deus o legislador espiritual, não observa somente a “aparência” do
bem, e sim a pureza interior, não fala somente ao nosso corpo, mas também fala
ao nosso espírito, não impõe obrigações somente ao corpo, mas também impõe ao
espírito dos homens.[5]
Assim, de nada adianta para aqueles que não
se armam contra os outros para os matar, que não entregam o seu corpo à
prostituição e não roubam, se, no seu interior respiram o ódio e a cobiça aos
bens do próximo, de nada adianta, se, no seu interior alimentam desejos
lascivos e etc. Nem pensem estes em se gloriar diante de Deus, pois está ausente
o ponto principal da Lei que é a justiça interna e espiritual que se desenvolve
em atos de retidão diante de Deus e diante dos homens.
Finalizando, as leis de Deus não se tornaram
espirituais no Novo Testamento com as afirmações de Jesus e do apóstolo Paulo.
Desde o Antigo Testamento por decorrerem de um Legislador espiritual as obrigações
ordenadas eram tão espirituais quanto o são agora.[6]
[1] Johannes
Geerhardus VOS, Catecismo Maior de
Westminster comentado, p. 294.
[2] João
CALVINO, As Institutas, Livro II, São
Paulo-SP: Ed. Cultura Cristã, 2006, livro II.VIII.6.
[3] Ernest
KEVAN, A Lei Moral, São Paulo-SP: Ed.
Os Puritanos, 2000, p. 74.
[4] Ibid, p.
73.
[5] João
CALVINO, As Institutas, Livro
II.VIII.6.
[6] Ernest
KEVAN, A Lei Moral, p. 75.
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